“Assim, meus
amados, como sempre vocês obedeceram, não apenas em minha presença, porém muito
mais agora na minha ausência, ponham em ação a salvação de vocês com temor e
tremor, pois é Deus quem efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar, de
acordo com a boa vontade dele”. (Filipenses 2:12-13).
No
primeiro comentário desta semana estarei falando para você amado e querido
leitor sobre os versos 12 e 13 do capítulo 2 de filipenses. Com base nestes
versos, estarei discorrendo acerca de duas correntes de pensamento acerca de
como se dá a salvação. Escolhemos a Deus para sermos salvos? Como dizem os que
defendem o livre-arbítrio, ou será que o Senhor nos escolhe? Como dizem os
calvinistas. Não estaremos tomando partido, mesmo nos sendo imputada opinião, estarei
discorrendo acerca da história, principalmente do arminianismo que é defendido
na lição, e é a interpretação mais recente acerca da salvação.
Jamais
quererei confundir a cabeça do leitor acerca destas interpretações
soteriológicas, pelo contrário, queremos conscientizar que cada uma das
interpretações tem suas raízes e razão de existir, por fim estarei dando uma
opinião geral acerca de ambas correntes.
O
debate acerca de como se dá a salvação por eleição predestinada ou por
livre-arbítrio humano tem mais de 1,5 mil anos, começou no quinto século da era
cristã e se estende até hoje e persistirá até estarmos juntos do Senhor em
Glória, em vida plena com Cristo.
Por
volta do ano 410 d.C. Pelágio já era um monge piedoso, era bretão,
provavelmente de origem irlandesa, que vivia como teólogo. Ao viajar a Roma
notou que naquela época os homens inverteram a graça em libertinagem (Jd 1:4),
então, preocupado com a degeneração dos homens, por causa da interpretação da
depravação da raça humana após o pecado de Adão, desde o nascimento o homem não
tem forças por si só de resistir ao pecado. Pelágio passa a organizar uma ideia
interpretativa que vá contra isso, para que as pessoas se convertam, daí passa
a dar uma nova visão acerca da graça de Deus e da vontade humana. Nesta mesma
época, o maior expoente da teologia daqueles dias, Agostinho, se opõe
ferrenhamente a visão pelagiana e em vários concílios Pelágio é condenado, mas
sua teologia não morreria por aí, mais de um milênio depois ela ressurge. Os
principais pontos da teologia pelagiana são¹:
1. É
de responsabilidade do homem se manter longe do pecado, mesmo após a queda este
tem o poder de vencer o pecado;
2. O
homem tem as mesmas capacidades morais e de escolha que Deus;
3. A
vontade do homem é livre podendo escolher entre o bem e o mal;
4. Não
existe pecado original, nem pecado herdado;
5. A
vontade do homem não é anulada mesmo após a queda de Adão e dos maus hábitos
humanos;
6. Adão
foi criado como mortal, mesmo que não pecasse ele morreria;
7. A
alma do homem não tem natureza pecaminosa, foi dotada de perfeição original e
pode manter-se assim;
8. A
criança nasce como uma tabula rasa;
9. O
pecado é uma volição depravada e não uma enfermidade da alma transmitida de
geração em geração;
10.
O batismo infantil é uma prática
legítima, mas não para perdão de pecados;
11.
Homens que não tiveram contato com o
evangelho serão julgados por suas obras;
12.
Negava de modo absoluto a
predestinação e exaltava a vontade e o livre-arbítrio humanos, isentando Deus
de toda a responsabilidade de conversão da raça humana.
Quando
Pelágio passa a difundir esta nova concepção da salvação, ele é altamente
atacado por quase todos os intérpretes das Escrituras da época, primeiro porque
estas interpretações não condiziam com os escritos paulinos. Era quase unânime
o texto áureo de Rm 8:31-39. Historicamente era uma interpretação nunca defendida
até a era apostólica, por isso, Paulo combate ferrenhamente a libertinagem de
muitos que transformavam a graça em uma brecha para o pecado, também Judas e
João o fazem. Eles combatiam não por crerem que o homem tinha volição para o
bem, mas pelo contrário, pois apesar da graça, os crentes deveriam obedecer os
preceitos.
Cerca
de 1.100 anos depois, mas precisamente em 1524, Erasmo de Roterdã,
contemporâneo de Lutero escreve Diatribe
sobre o Livre Arbítrio, defendendo ideias pelagianas e usando várias
referências bíblicas. Lutero de imediato respondeu criticamente a este escrito,
publicando De Servo Arbítrio, A
Escravidão a Vontade.
Erasmo
reitera as ideias pelagianas e em resposta a ele Lutero chega a afirmar que ele
procura infundir medo em seus oponentes,
reunindo um grande número de textos bíblicos que supostamente dão apoio a ideia
do livre-arbítrio².
Em
uma vastidão de escritos Lutero descarrega textos bíblicos e chega a chamar
calorosamente de filhos do pecado são aqueles que dizem ter livre-arbítrio,
vontade própria para buscar a Deus.
100
anos depois a força do livre-arbítrio aumenta e se expande por boa parte do
mundo através da expansão dos ensinos do professor Jacob Hermano (Armínio),
professor holandês de teologia que viveu entre 1560-1609. As doutrinas de
Armínio foram expostas e trouxeram de vez ao combate contra a predestinação a
concepção teológica do livre-arbítrio, influenciando sistematicamente o
pensamento ocidental moderno. São doutrinas arminianas, segundo seus
discípulos:
1. Deus
prevê o futuro, mas não foi ele quem causou todas as coisas;
2. A
eleição é baseada na fé prevista;
3. O
homem predomina sobre outras criaturas porque é a imagem de Deus;
4. Adão
era inocente, mas não santo;
5. O
pecado é consequência de atos voluntários de quem é rebelde;
6. A
vontade do homem pode ser para o bem ou para o mal;
7. A
expiação só é mais uma maneira de amor de Deus e não a única busca por
salvação;
8. A
vontade humana é uma das causas da regeneração;
9. Nesta
via o homem pode chegar a perfeição se adequando a vontade de Deus;
10.
O homem pode perder a salvação se cair
da graça;
11.
A expiação é uma realização simbólica
que visa salvaguardar os interesses maiores de Deus;
12.
Plena certeza de salvação não existe.
Armínio
apesar de ter vivido pouco tempo após Calvino e sofrido também a influência dos
estudos calvinistas, se opôs a muitas das interpretações sobre a predestinação.
Os
discípulos de Calvino no sínodo de Dort levantaram cinco pontos do calvinismo
para tentar pôr fim na controvérsia
doutrinária acerca do arminianismo³.
Os
cinco pontos tornaram-se em cinco capítulos bem detalhados com os seguintes
temas:
1. Eleição
incondicional;
2. Expiação
limitada aos eleitos;
3. Depravação
total, que envolve tanto a habilidade quanto o mérito;
4. Graça
irresistível;
5. Perseverança,
ou segurança eterna do crente.
Agora
vamos em resumo fazer uma análise crítica de ambas interpretações: O maior
problema de ambas as concepções acerca da soteriologia, ou estudo da salvação é
de querer derrubar uma a outra, não estão abertas aos paradoxos que a Bíblia
trás e contraria as perspectivas humanas. Tanto calvinistas quanto arminianos
tem textos suficientes para alimentar sua teologia quanto também para
derrubá-la. Por isso, amados irmãos não defendo nenhuma das duas
interpretações, pois há coisas que só um dia teremos a plena revelação de Deus.
O
verso 2:14 de filipenses nos mostra ...fazei
todas as coisas sem murmurações e sem contendas. Será que calvinistas e
arminianos “convictos” seguem estas doutrinas para fazer crescer e expandir o
evangelho ou só creem para se sentir superior aos outros? Reflitamos nisto.
__________________________________________
¹
R.N. CHAMPLIM. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.
²
LUTERO, MARTINHO. Nascido Escravo.
³
R.N. CHAMPLIM. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.
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